sexta-feira, 15 de maio de 2009

Um choque cultural por 1,20€

Já que não havia sono para la siesta, fui explanar para uma rambla perto de casa - tipo Av. 25 de Abril em Famalicão, mas com a placa central a servir para alguma coisa, como é obvio (!) – munido de um El País comprado num dos quiosques que a pontuam. Ao cabo da página 2 já me estava a recordar do que disse ao Ruca em terras limianas, depois de um sarrabulho, durante uma discussão sobre a diferença que na altura pensava existir entre a integração na globalidade de Portugal e Espanha: “É mais verdadeiro quem vive em verdade com o seu tempo, e num tempo Global a relação dos media de nuestros hermanos com as suas ex-colónias ou com as esquinas da globalização quando comparada com os nossos, é uma forma eficaz de medir a verdade em que o povo vive.”

Lembro-me na altura de ter dado o exemplo do tratamento dos debates presidenciais americanos (em Espanha passaram em directo, com mesas redondas antes e depois, apesar de ser uma da manha, enquanto a nossa televisão dava uma novela brasileira ou dinheiro a quem acertasse numas palavras cruzadas absurdas) e da frequência que os assuntos da comunidade que fala o castelhano são abordados nos telediarios.

Voltando à página 2 do El País, escreve-se em título: “Chávez lanza su revolución cultural” desenvolvendo-se o tema do novo Plan Revolucionario de Lectura que pretende dar seguimento ao Programa de Alfabetización que reduziu o analfabetismo de maiores de 15 anos de 9% para 6% e que irá pôr a população a ler material ideológico-político, de Bolívar a Simon Rodriguez, de Orlando Araújo a Ludovico Silva e claro de Chavez a Che. Na notícia, louva-se quando é louvável e reprova-se quando é reprovável, como deveria acontecer em qualquer país ocidental.

Na página 3 fala-se da Guatemala, onde o Presidente Colom ao que parece mandou matar el abogado Rosenberg que iria denunciar corrupção na administração Colom, que se recusa a demitir apesar da pressão de que está a ser alvo, principalmente depois desta página 3 ter sido escrita.

Papa no Médio Oriente, Barack Obama em Guantânamo e a nomeação de um hispânico para secretario para a America Latina, Berlusconi e a imigração, Gordon e a pouca vergonha parlamentar, Índia e as eleições e por aí adiante.

À página décima segunda chegamos a Espanha e à bela Sonsoles Zapatero.

Chego à página 32 e dou com um caderno central composto por artigos do New York Times, traduzido, por supuesto. A última parte do jornal trata de assuntos maioritariamente europeus e de cultura nacional e internacional.

Mas será que alguém em Portugal faz puto de ideia sobre o que pensa, de bem e de mal, o Movimento dos Sem Terra no Brasil, sobre a corrupção e os que morrem por ela em Angola, ou o que pensam os intelectuais em Times Square, quando se compra O Público? De Times Square, ou de lá perto, sabe-se do orgulho lusitano de um cão que habita a casa branca; de Angola sabe-se que o Eduardo dos Santos é espectacular e que faz tudo bem (pelo menos enquanto a filha der de comer ao banqueiros e construtores lusos), e do MST sabe-se que partem umas coisas de vez em quando, ou que escreve uns artigos e uns livros.

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